quinta-feira, 21 de outubro de 2010

AGORA...


Agora,

que tornaram as praias

à calma das às gaivotas e à espuma

das ondas borbulhando entre seixos e conchas;

Agora,

que posso caminhar descalço pelo areal

à procura dum búzio que devolva

a voz de espanto

da criança que fui

querendo, balde a balde, despejar o mar

naquela poça que cavei com as mãos na areia;

Agora

que o vento mais fustiga as velas dum veleiro

do que os choupos do rio

que atravessa a minha aldeia;

Agora...

agora é que eu descubro

quantos mistérios vão a transportar

no porão dum navio

e quanto é fundo o mar...

sábado, 9 de outubro de 2010

DO CAMELO AO MIRAGE

De alguns milhões com tudo aos biliões sem nada,
Da nudez do taipal à cor do manifesto,
Refastela-se a besta, impondo que amestrada
Se limite a formiga a contornar o cesto...

Que o sol aqueça o toldo, o rótulo presida
Ao riso, o trigo falte e sobre a gasolina,
Venha a central do juro e atenta se decida
Renovar a cidade em filiais de esquina...

Amor que em dar exija os lábios confundir
Ou, precisando mais (e não te surpreendas),
Seja ir daqui além, buscando reunir
Certo botão de punho a rendas e fazendas...

Tanto que a pouco saiba e se pretenda a lua
Pelo sim pelo não apenas sorridente
E se imagine loura e se apresente nua
Capaz de promover o novo detergente...

Que depois venha agora e sempre antes de já
E amanhã chegue ainda a tempo de esquecer
A fome de milhões c'os milhões que ainda há
Para ferir de morte o direito a viver...

Do cotovelo à dor passando pelo busto
Seja a virtude mãe do mais secreto ultraje
E cheguem sempre os réis às cinzas do magusto
na bossa dum camelo, a bordo dum mirage...

Do celeiro ao paiol arado se transforme
Em ás de artilharia, o submarino avance,
Venha o neutrão depois e fique a noite enorme
Até que finalmente o carnaval descanse...

Por que será, meu Deus!, que tem de ser assim:
De Terça-Feira-Gorda a Sexta-de-Paixão?
Será que a Tua mão a isto porá fim?
Eu quero crer que sim!, mas receio que não!

Coimbra, Outubro de 2010 - Santos Kim